quinta-feira, 6 de dezembro de 2012


Comitê da ONU aprova texto para acabar com a mutilação genital feminina

29 de novembro de 2012 · Notícias (fonte: Boletim semanal da ONU)

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Facas cerimoniais utilizadas em MGF / E por membros da sociedade Bondo em Serra Leoa. Foto: IRIN / Bryna HallamOs Estados-Membros das Nações Unidas aprovaram, nesta segunda-feira (26), pela primeira vez um projeto de resolução que visa acabar com a prática nociva da mutilação genital feminina, em um movimento aclamado pelo Secretário-Geral, Ban Ki-moon, como um grande passo em direção à proteção de milhões de mulheres e meninas.
O texto foi aprovado por consenso pelo Terceiro Comitê da Assembleia Geral, que lida com as questões sociais, humanitárias e culturais, e poderá ser adotada pela Assembleia no próximo mês. Além de exigir que Estados tomem medidas para proteger as mulheres e meninas e acabar com a impunidade da prática, o texto também sugere a designação do dia 6 de fevereiro como o Dia Internacional de Tolerância Zero para a Mutilação Genital Feminina.
A mutilação genital feminina/excisão (MGF/E) refere-se a diversas práticas nocivas que envolvem o corte dos genitais femininos por razões não médicas. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que 140 milhões de meninas e mulheres em todo o mundo vivem atualmente as consequências desta prática.
“Estou ansioso para que a Assembleia adote a presente resolução, o que marcaria um passo importante na proteção das mulheres e das meninas e acabe com a impunidade dessa prática”, afirmou o Secretário Geral, Ban Ki-moon, ontem (28), durante o evento que marcou o Dia Internacional para a Eliminação da Violência contra as Mulheres.
Nos últimos três anos, cerca de oito mil comunidades em todo o mundo, incluindo 15 países africanos, abandonaram a prática, de acordo com o Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA). Só no ano passado duas mil comunidades declararam que não vão mais permitir  a continuidade desta violação de direitos humanos.

sexta-feira, 26 de outubro de 2012

Dia da ONU: ruim com ela, pior sem ela!

24 de outubro, dia das Organizações das Nações Unidas: ruim com ela pior sem ela




"A data de 24 de outubro é comemorada como Dia das Nações Unidas desde 1948. Ela marca o aniversário da entrada em vigor, em 1945, da Carta da ONU. Com a ratificação do documento fundador pela maioria de seus signatários, a entidade passou a existir oficialmente (Boletim semanal da ONU Brasil – No 75 – 25/10/2012)"
A ONU completou oficialmente (ver nota do boletim ONU), em 24 de outubro, quando se festeja o dia da ONU, 64 anos de existência e a despeito das diversas críticas da sua atuação como promotora da segurança e da paz, podemos verificar que sem ela a situação do mundo poderia ser bem pior. Seus críticos são contundentes, mas pouco razoáveis, uma vez que, de uma forma, ou de outra, a organização serviu, e serve, como amortecedora de muitos conflitos, que sem a atuação da comunidade, com certeza,  o mundo que conhecemos, já haveria implodido, ou explodido!
Não são poucos os que a acusam de modeladora do sistema neoliberal estadunidense. Também, são incontáveis os que a acusam de omissão em casos que desagradam, ou não interessam, aos cinco membros permanentes do Conselho de Segurança, quais sejam, Estados Unidos, Reino Unido, França, Rússia e China.
Entretanto não analisam que a Organização é uma evolução histórica, quando tratamos de política internacional. Pois, apesar dos consensos dos cinco poderosos membros permanentes, poderíamos estar imersos em um mundo destruído por uma guerra atômica, ou ainda escravos do nazismo. Queiram, ou não, de alguma forma, o jogo do poder, após a segunda guerra, com a criação da ONU, foi freado por vetos, dissensos e consensos.
Diversas iniciativas e diversos programas onusianos provam o argumento da evolução histórica. A maioria da população desconhece a incrível penetração da ONU no mundo.  
A ONU, por seus órgãos principais, a Assembléia Geral, o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social, o Conselho de Segurança, a Corte Internacional de Justiça e o Secretariado, atua eficazmente em diversos setores da comunidade internacional.
Um dos exemplos é o patrocínio, pelo World Bank, do programa bolsa família, tanto o primeiro, quanto o segundo. Programa que garante o micro-crédito em todo o Brasil à famílias de baixa renda, principalmente no norte-nordeste brasileiro. Se o programa tem sido usado para fins políticos eleitoreiros, bom, isso é uma questão de desvio de finalidade que poderá ser julgado pelos beneficiados no futuro, mas tem um cunho social e econômico muito impactante para o país.
Poderíamos citar diversos programas, fundos, comissões, agências especializadas, iniciativas permanentes que pertencem as Nações Unidas, mas um programa inquestionável, que talvez nem todos saibam que pertence a ONU, é a UNICEF.  Quantas crianças no mundo já foram beneficiadas por esse programa? Uma simples visita a página na internet  (http://www.unicef.org/) e o cidadão comum terá condições de perceber a densidade sócio-econômica que tem essa iniciativa.
Quantos saberão dizer o que é, qual a atuação da ACNUR no mundo de hoje?  A agência da ONU (http://www.acnur.org/t3/portugues/) para refugiados e apátridas, atua repatriando, acolhendo, alimentando, reinserindo, protegendo esses seres humanos sem territórios, sem pátrias, seja por guerra, por perseguição política, entre outros deslocamentos forçados.  Um dos expoentes desta agência foi o brasileiro Sérgio Vieira de Mello, “o homem que queria salvar o mundo” (Power, Samantha, 2008). Vale uma sugestão de pesquisa ao site da agência e mais especificamente a Cátedra Sérgio Vieira de Mello. São informações preciosas sobre uma maravilhosa atuação, em uma perspectiva de direitos humanos, das Nações Unidas.
Outra iniciativa permanente da ONU é a Aliança de Civilizações ( www.unaoc.org) , criada (2005) após um atentado terrorista na rede ferroviária da Espanha, em 2004, quando um país, de cultura cristã, a Espanha, aliando-se a um país, de cultura mulçumana, a Turquia, reagiram de forma convergente a um ato violento de divergência a vida humana.  Essa iniciativa tem como foco principal a educação, juventude, meios de comunicação e emigração. Promovem desenvolvimento através do diálogo de diferentes culturas. Fomentam a interação de povos, teoricamente inimigos, objetivando a paz entre os povos.
Poderíamos citar diversas outras iniciativas e outros programas, mas não cabe nesse artigo, que tem como único objetivo parabenizar a raça humana por tentar promover a segurança e a paz, mesmo que ainda não seja o ideal, mas uma evolução histórica, quem sabe ao ideal, parabéns a ONU por seus 64 anos de existência.   

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

X Conferência de Ministros de Defesa

Surpresa: duas derrotas dos EUA na América do Sul

 
 

Celson Amorin, ministro da Defesa brasileiro, observa Leon Panetta, chefe do Pentágono: sem concessões

Conferência dos ministros de Defesa rechaça planos de Washington. E a Venezuela caminha para parceria estratégica com a China
Por Raúl Zibechi, Programa de las Américas | Tradução: Vila Vudu
Em menos de uma semana, a política dos EUA para a América Latina sofreu duas derrotas, em dois temas estreitamente associados: a vitória eleitoral de Hugo Chávez e o fracasso na tentativa de impor os critérios do Pentágono na X Conferência de Ministros de Defesa.
Venezuela: eleição decisiva
Poucas vezes alguma eleição dividiu a região de modo tão nítido como a do dia 7 de outubro, na Venezuela. Tanto os governantes como boa parte da população sabiam que do resultado dependiam não só a continuidade do processo bolivariano, mas, também, o aprofundamento da integração regional, a ampliação do Mercosul e, provavelmente as relações pacíficas entre os vizinhos.
“Das 92 eleições que monitoramos, eu diria que o processo eleitoral na Venezuela é o melhor do mundo”, disse Jimmy Carter, dia 11/9, ao celebrar os 30 anos do Carter Center [1]. Dias antes das eleições, em Caracas, o embaixador dos EUA Patrick Duddy sugeriu que, se o pleito fosse “aceitavelmente livre e justo”, seu país deveria “resetar” as relações bilaterais, com vistas a uma eventual renovação de comunicações de alto nível em áreas de interesse mútuo” [2].
Houve reações esperadas e outras quase surpreendentes. O fervor de Cristina Kirschner, presidenta argentina, e a cálida felicitação do colombiano Juan Manuel Santos eram esperados. O chanceler chileno Alfredo Moreno, membro do governo conservador de Sebastián Piñera, destacou que as eleições venezuelanas foram um “exercício democrático impecável”. O porta-voz do Departamento de Estado, William Ostick, felicitou “o povo venezuelano”, mas não o presidente, e conclamou o vencedor a levar em conta “as mais de 6 milhões de pessoas que votaram pela oposição”. A União Europeia disse mais ou menos o mesmo [3].
A oposição aceitou o resultado e ninguém falou em fraude, motivo pelo qual houve quem supusesse que Washington tivesse modificado sua habitual hostilidade contra o governo Hugo Chávez[1]. Nada disso. No mesmo dia, o secretário de Defesa dos EUA, Leon Panetta, partia para seu segundo giro pela região, dessa vez ao Peru e ao Uruguai, levando debaixo do braço um documento de 12 páginas, “A Política de Defesa para o Hemisfério Ocidental” que o Departamento de Defesa dos EUA havia divulgado na 4ª-feira, 3/10[2].
China: da cautela à euforia
Com a vitória de Chávez, o primeiro inimigo estratégico dos EUA consolida sua presença na região. O papel da China na Venezuela é chave. O intercâmbio comercial bilateral passou de 1,9 bilhão, para 10,272 bilhões de dólares, o que fez da China o principal parceiro comercial de Caracas. Beijing aportou 52 bilhões de dólares em “fundos de financiamento conjunto” à Venezuela, a qual paga com petróleo, à razão de 640 mil barris/dia [4].
Para 2014, a sucateada indústria petroleira venezuelana espera produzir 4 milhões de barris diários, dos quais 1 milhão serão exportados para a China. No final de novembro passado, os presidentes de Venezuela e Colômbia assinaram vários acordos de cooperação, entre os quais o Projeto Binacional Oleoduto Venezuela-Colômbia, para exportar 500 mil barris de cru diários pela costa do Pacífico até a China, que seria o “sócio estratégico” num projeto que prevê investimento de 8 bilhões de dólares [5].
A Venezuela vem reorientando suas exportações de petróleo, que representam 90% de suas exportações totais. Em 1999, quando Chávez assumiu a presidência, os EUA compraram do país 1,5 milhões de barris/dia, cifra que caiu para 764 mil barris/dia em novembro de 2011, a menor em nove anos [6]. Como se pode ver, o mercado chinês está progressivamente substituindo o mercado norte-americano.
Dia 16/9/2010 assinou-se um acordo entre os governos de Venezuela e China sobre cooperação para financiamento em longo prazo. Chávez disse que o volume do investimento chinês na Venezuela é o maior de toda a história dos 60 anos da República Popular e concluiu: “Todo o petróleo de que a China possa necessitar para consolidar-se como grande potência, encontrará na Venezuela” [7]. Vale lembrar que as reservas venezuelanas de petróleo já ultrapassaram as da Arábia Saudita e são hoje as maiores do mundo.
Mas nem tudo é petróleo. A China tem 430 projetos de desenvolvimento na Venezuela, em setores de eletricidade, transporte, mineração, moradias, finanças, gás, petróleo e petroquímica. Está contribuindo para o desenvolvimento das vias férreas, e há 50 projetos para exploração de alumínio, bauxita, carvão, ferro e ouro [8]. A cooperação binacional intensificou-se nos últimos cinco anos. Desde 2007, o Banco de Desenvolvimento da China emprestou 42 bilhões de dólares à Venezuela, 23% de todos os empréstimos internacionais do banco estatal chinês e praticamente o dobro de tudo que os EUA investiram, entre 2003 e 2006, para reconstruir o Iraque (29 bilhões) [9].
Sem dúvida, o dinheiro chinês é fundamental para a economia de um país que quase não recebe investimentos estrangeiros diretos. Mesmo os investimentos chineses chegaram devagar: só 240 milhões de dólares entre 1990 e 2009 [10]. Talvez por essa razão, o governo chinês, que manifestara certa cautela nas semanas que antecederam a reeleição, não escondeu seu entusiasmo com os resultados, com Chávez reeleito para mais seis anos, e prometeu conduzir as relações entre os dois países “para um novo nível” [11].
Dinheiro novo, em troca de petróleo
A Venezuela paga a metade dos juros de mercado (6%, não 12%) e com esse dinheiro pode planejar obras como as 33 mil moradias que a empresa Citic constrói na China e atender aos crescentes investimentos do Estado. Em troca, Chávez oferece aos chineses participação na exploração do petróleo pesado da Faixa do Orinoco e no projeto das minas Las Cristinas, das maiores reservas de ouro do mundo [12]. Também assinou com a empresa Citic um acordo para mapear todas as jazidas minerais do país [13].
Graças à cooperação chinesa, a Venezuela já pôs em órbita dois satélites; o primeiro “Simón Bolívar”, em 2008, atende as telecomunicações; e o “Miranda”, em 2012, que será usado no planejamento urbano, em operações militares e na luta contra exploração ilegal de minas e plantios ilegais. Segundo o governo Chávez, os satélites permitirão “planejar a ocupação do território, cuidar melhor do meio ambiente, de nossas fronteiras, de nossos recursos naturais e de nosso povo” [14].
As relações com a Rússia também serão fortalecidas, mas são vínculos basicamente diplomáticos e militares. A indústria de armamentos russa está incrementando suas exportações, embora continue muito atrás da norte-americana. Entre 2012 e 2015, o principal comprador de armas russas será novamente a Índia, com 14 bilhões de dólares; mas a Venezuela já aparecerá em 2º lugar, deslocando assim a Argélia e a China, com compras projetadas de 3,2 bilhões de dólares segundo Ígor Korotchenko, diretor do Centro de Análise do Comércio Mundial de Armas [15].
A segunda viagem de Leon Panettta
Dia 7 de outubro, antes que se abrissem as urnas na Venezuela, o secretário de Defesa dos EUA Leon Panetta iniciou seu segundo giro pela região em apenas cinco meses [16]. Dessa vez veio armado com um documento de 12 páginas, “A Política de Defesa para o Hemisfério Ocidental” [17]. O texto é continuação do que foi elaborado em janeiro sobre as prioridades para a Defesa. Nos dois documentos, o objetivo é “manter a liderança mundial dos EUA”.
A política desenhada pelo Pentágono e pela Casa Branca para a região leva em conta dois novos fatos: as mudanças no mundo, entre as quais o novo papel da América do Sul, e o que lá se chama “a limitação de recursos”, como consequência do endividamento e da crise econômica que impõem restrições no orçamento militar.
Em consequência, o Pentágono já não pretende que seu principal modo de operar continue a ser o deslocamento militar direto na região; espera manter sua “liderança” mediante “enfoques inovadores, econômicos e praticamente sem ter de pôr os pés fora de casa. E espera, para conseguir isso, obter “esforços de cooperação” para “alianças bilaterais e regionais” à base do que entende que sejam “interesses comuns de segurança” [18].
Como os EUA encontram-se num “ponto estratégico de  inflexão” pelo qual suas forças de concentrarão no Pacífico Asiático, trata-se, na América Latina, de encontrar “sócios” que se convertam em “exportadores de segurança”. O documento cita dois casos: o da Colômbia, cujas forças de segurança partilham “conhecimentos técnicos nos campos da aviação, antissequestro e luta contra o narcotráfico”, e o de San Salvador cujos “capacitadores” trabalham no Afeganistão e no Iraque. (São algumas das consequências ou sucessos  do “Plan Colombia”, aspectos que Panetta não menciona.)
Com base nessas alianças, o Pentágono defende que “começa a aflorar uma rede interconectada: um sistema de cooperação para a defesa”, a partir de alianças “flexíveis e ágeis, capazes de responder aos desejos do país amigo e de mudar conforme aumenta a capacidade das forças militares dos países”.
Mas, apesar das aparentes boas intenções, os objetivos e os meios serão unilateralmente definidos pelo Departamento do Defesa. “As ameaças atuais à estabilidade e à paz regionais emanam da difusão do narcotráfico e outras formas de tráficos ilícitos, agitações e terrorismo, cujos efeitos podem resultar em acentuados desastres naturais e por uma oportunidade econômica desigual”. E acrescenta às ameaças atuais também a “novas ameaças no ciberespaço.”
Apesar de propor alianças “inovadoras”, o documento ainda aposta no que denomina “instituições de defesa maduras e profissionais” – entre as quais a Conferência de Ministros de Defesa das Américas que se faz a cada dois anos e a Junta Interamericana de Defesa (JID), no marco da OEA.
Panetta divulgou o documento pouco antes de participar da X Conferência, aberta na 2ª-feira, 8/10 em Punta del Este, Uruguai.
Como assinalou o analista argentino Horacio Verbitsky, o documento de Panetta “utiliza indistintamente “segurança” e “defesa” – o que não está sendo bem visto por boa parte dos países sul-americanos [19]. Verbitsky recorda que o Mercosul “rejeita o conceito de desastre natural, que substituiu por desastre socionatural”, o que pressupõe entender esses desastres como situação complexa e sobre tudo só agir no caso de haver pedido expresso “não entre forças armadas, mas pedido feito pelo governo do país afetado”.
A proposta do Pentágono
A proposta feita pelo Pentágono através do Chile, um dos sócios destacados na região, consiste em que as forças armadas coordenem as respostas aos “desastres”, acrescentando que, nessas “respostas” devem usar “unidades ou meios que tenham capacidade mínima de sete dias de operação com autossuficiência”.
Esse parágrafo alarmou várias chancelarias, entre elas a Argentina, dado que a maioria dos países da região não têm a tal capacidade “técnica”, o que deixaria o Pentágono na posição de único protagonista, como já aconteceu no caso do terremoto no Haiti em janeiro de 2010.
Por outro lado, para o mesmo Verbitsky, “os EUA tentam reformular a Junta Interamericana de Defesa (JID), para não perder uma ferramenta de controle sobre as forças armadas e de segurança na região”.
Vários países questionam a vigência das instituições multilaterais hemisféricas de defesa criadas durante a Guerra Fria, entre elas o Tratado Interamericano de Assistência Recíproca (TIAR), criado em 1947. O mesmo se pode dizer da Junta Interamericana de Defesa (JID), entidade criada pela OEA, constituída em 1942.
O fracasso da “diplomacia militar” dos EUA
Sinal dos novos tempos, vários países da Aliança Bolivariana da Américas (ALBA) chegaram à X Conferência de Ministros de Defesa, esse mês, depois de terem decidido, em junho passado, separar-se da TIAR, que entendem já ferida de morte depois do conflito das Malvinas, em 1982 – quando os EUA apoiaram a Inglaterra, potência extra-hemisférica, e não apoiaram a Argentina [20]. Trata-se aqui de Venezuela, Bolívia, Equador e Nicarágua.
Somam-se a esses países as reticências de Brasil e Uruguai, contra a JID. O ministro uruguaio de Defesa, Eleuterio Fernández Huidobro, disse em seu discurso na Conferência de Ministros que a JID tem 70 anos, que está “velha”, que nasceu quando, no mundo “aconteciam coisas muito feias” [21]. Acrescentou que a desigualdade “é o grande problema que subjaz ou sobrevoa todos os outros problemas” e que “nem todos os militares do mundo algum dia darão conta de resolvê-lo”. E disparou:
“Durante esses anos, sofremos a ação de organizações criminosas internacionais piores que as do tráfico de drogas, armas e terrorismo. Falo, em boa parte, do sistema financeiro internacional que, mediante saques, assaltos, batendo carteiras e com roubos de todos os tipos provocou estragos até nos países mais ricos do mundo, mas, sobretudo entre as populações daqueles países. E, esses, andam pelo mundo soltos, um bando de criminosos transnacionais altamente perigosos que não podem ser excluídos de nossa lista de ameaças e riscos”.
Panetta ouviu em silêncio.
Mas a intervenção que mais bem refletiu o clima na região foi a do ex-chanceler do Brasil, atual ministro da Defesa, Celso Amorim. Sua fala foi a primeira na Conferência de Punta del Este. Disse que:
“Um sistema interamericano de Defesa como foi pensado imediatamente depois da 2ª Guerra Mundial é coisa que já nada tem a ver com o mundo de hoje, mundo multipolar, onde não há ameaça única nem continentes homogêneos” [22][3].
Defendeu a cooperação em temas de saúde, defesa e desastres naturais, mas “sempre que haja autoridades civis à frente”. E fez mais: questionou o papel das potências no Oriente Médio, a composição do Conselho de Segurança da ONU, disse que a prioridade do Brasil é a Unasul e o Conselho de Defesa Sul-Americano, apoiou a defesa da soberania argentina sobre as ilhas Malvinas, defendeu um Atlântico Sul livre de armas nucleares e ainda acrescentou:
“Nosso problema não é de proliferação: é de desarmamento. Que as grandes potências desmontem todos os seus arsenais nucleares.”
Tudo isso, em apenas 22 minutos!
Os 29 países que participaram da Conferência de Ministros da Defesa discutiram durante 48 horas os temos do documento final. Aprovaram a criação de um Sistema Cooperativo de assistência humanitária de caráter voluntário “que respeitará a legislação de cada país e cuja coordenação e direção ficarão a cargo das autoridades civis” – como explicou o ministro argentino de Defesa, Andrés Allamand.
Argentina, Brasil, Bolívia, Equador, Nicarágua, Surinam e Venezuela votaram contra os termos do documento final; Guyana e Uruguai abstiveram-se. “Foi a primeira vez, na história desse fórum continental, que se realiza desde 1995, que foi preciso votar, ante a falsa de consenso” (AFP, 10/10/2012).
A declaração final da X Conferência de Ministros de Defesa não acolhe as principais inquietações do Pentágono – principalmente a intenção de fazer acordos diretamente com as forças armadas de cada país, sem considerar os governos políticos, que tem sido criticada como uma modalidade de “diplomacia militar”.
Bem diferente disso, a Declaração de Punta del Este “inclui o respaldo aos direitos soberanos da Argentina sobre as ilhas Malvinas” (item inicialmente rechaçado pelo Canadá e EUA) e recomenda muito vagamente que se continue e estudar o “sistema interamericano de Defesa”. Os países da Unasul, exceto Chile e Colômbia, que apoiaram a Argentina em outros termos, “manifestaram sua preocupação com a crescente militarização do Atlântico Sul e com exercícios armamentistas que se realizam nas ilhas Malvinas”[23].
O que os países latino-americanos rechaçam cada dia mais claramente é o estilo do Pentágono de manter relações diretas “militares-militares” só com as forças armadas de cada país, desconsiderando os governos – exatamente o que sempre fez a Junta Interamericana de Defesa (JID) e faz agora o Comando Sul. O relato de Verbitsky sobre como funciona o Grupo Militar dos Estados Unidos na Argentina, o qual, durante décadas, manteve escritórios e gabinetes em instalações do exército argentino, numa “interação horizontal e direta só com as forças armadas, sem pedir autorização e sequer sem informar o Ministério da Defesa argentino”[24], ilustra um modo de operar que já não é aceito, na nova correlação de forças.
A continuidade do processo bolivariano e talvez o aprofundamento nos anos futuros potencializarão a crescente autonomia política, econômica e militar da região em relação aos EUA.

NOTAS
[1] Citado por Mark Weisbrot, The Guardian, 3/10/2012. Ouve-se a conferência completa em http://cartercenter.org/news/multimedia/Conversations/30-years-of-the-carter-center.html Em 44’, a referência à Venezuela.
[2] Citado por Clovis Rossi, Folha de São Paulo, 9/10/2012.
[3] “EEUU no felicita a Chávez pro valora votación de la oposición”, AFP, 8/10/2012.
[4] Agência Xinghua, 27/9/2012.
[5] Radio Caracol, 19/5/2012 en http://www.caracol.com.co/noticias/economia/venezuela-dice-que-oleoducto-con-colombia-transportara-500000-barriles-dia/20120519/nota/1690890.aspx
[6] Associated Press, 2/2/2012
[7] La Jornada, 26/9/2010
[8] Idem.
[9] “China financia Chávez, em troca de petróleo, e ajuda na sua reeleição”, Valor, 1/10/2012.
[10] “China, no tan cerca como busca Chávez”, La Nación, 7/10/2012.
[11] Agencia Telam, 8/10/2012.
[12] Valor, 1/10/2012.
[13] http://www.delglobo.com/index.php?option=com_k2&view=item&id=4475:venezuela-y-china-acuerdan-explotación-de-oro-en-las-cristinas&Itemid=7
[14] El Universal, 29/9/2012, en http://www.eluniversal.com.mx/notas/873531.html
[15] Gazeta Russa, 9/10/2012.
[16] Sobre a primeira visita, ver Raúl Zibechi, “El Pentágono busca recuperar la iniciativa en Sudamérica”, en http://www.cipamericas.org/es/archives/6866
[17] www.defense.gov/news/WHDPS-Spanish.pdf
[18] Todas as citações são extraídas do Documento do Departamento de Defesa.
[19] Página 12, 8/10/2012.
[20] “Continente debatirá pertinencia del sistema interamericano de defensa”, AFP, 6/10/2012.
[21] El País, 9/10/2012.
[22] “Multiplicidad de percepciones impide sistema continental de defensa”, AFP, 8/10/2012.
[23] http://www.presidencia.gub.uy/wps/wcm/connect/Presidencia/PortalPresidencia/Comunicacion/comunicacionNoticias/declaracion-final-x-conferencia
[24] “Las cartas sobre la mesa”, Página 12, 30/9/2012.



* Fontes: Agência Xinghua, “Relaciones con Mercosur y China marcarán próximos seis años de Venezuela”, 27/9/2012 / Departament of Defense, “La política de Defensa para el Hemisferio Occidental, out. 2012 / Horacio Verbitsky, “Los nuevos desafíos”, Página 12, 8/10/2012 / Mark Weisbrot, “Why the US demonises Venezuela’s democracy”, The Guardian, 3/10/2012.
[1] A revista Carta Capital, São Paulo, 17/10/2012, ano XVIII, n. 719, em matéria de Claudia Jardim, de Caracas, tem outra explicação para Capriles não ter contestado o resultado: “O opositor Capriles aceitou a derrota, de olho na disputa dos governos estaduais em dezembro” (p. 41) [NTs].
[2] Sobre a viagem de Panetta, ver também “Depois do Afeganistão, os EUA mudam-se para a América Latina”, 6/12/2012, Stop NATO, em http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/10/depois-do-afeganistao-o-pentagono-muda.html [NTs]
[3] 14/10/2012, Intervenção do Ministro da Defesa do Brasil, Celso Amorim, na X Conferência dos Ministros de Defesa das Américas http://redecastorphoto.blogspot.com.br/2012/10/intervencao-do-ministro-da-defesa-celso.html

quarta-feira, 23 de maio de 2012

Especialistas da ONU pedem imposto global sobre operações financeiras para proteger direitos humanos

14 de maio de 2012 · Notícias

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fonte: push da ONU Brasil
Relatora Especial sobre a situação de extrema pobreza e direitos humanos, Magdalena Sepúlveda. (ONU/Mark Garten)Um grupo de Especialistas Independentes das Nações Unidas apelou hoje (14/05) para que a União Europeia assuma a liderança na promoção da implementação de um imposto global para operações financeiras que compense os custos da atual crise econômica e proteja os direitos humanos.
De acordo com o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), as estimativas indicam que, em sua menor taxa, o imposto sobre operações financeiras sugerido renderia cerca de 48 bilhões de dólares apenas entre as negociações do G-20. Se o imposto alcançasse taxas mais elevadas ofereceria até 250 bilhões de dólares por ano para compensar os custos das duradouras crises econômica, climática, de combustível, financeira e alimentar.
“Onde a crise financeira mundial provocou a perda de milhões de empregos, socializou os custos da dívida privada e agora arrisca causar regressões significativas de direitos humanos por meio de pacotes abrangentes de austeridade, um imposto sobre operações financeiras é uma ferramenta pragmática para fornecer os meios para os governos protegerem e fazerem cumprir os direitos humanos de seus povos”, disse a Relatora Especial sobre Pobreza Extrema e Direitos Humanos, Magdalena Sepúlveda.
“Um imposto global ajudaria a aliviar a carga da dívida soberana decorrente da crise financeira, transferindo o peso que se direcionava aos cidadãos comuns para o setor privado, que causou a crise, e significativamente ampliaria o espaço fiscal do governo para os gastos com os desesperadamente necessários programas de direitos econômicos e sociais”, acrescentou o Relator Especial sobre a Dívida Externa e Direitos Humanos, Cephas Lumina.

sábado, 25 de fevereiro de 2012

Irã x ONU, quem está com a verdade?



Quem está com a verdade? Não sabemos! Agora, quais são as próximas jogadas dos atores envolvidos?

Há sinais que o grupo liderado pelos EUA vai tomar medidas mais enérgicas que as tomadas até então, e, paradoxalmente, o Irã parece não temer as retaliações, ou executa um grande blefe, ou é louco o suficiente para enfrentar o risco da colisão com as forças ocidentais. Torcemos para que o grupo de moderados (liderados pelo Brasil e Turquia) consiga tecer um acordo. Há muito mais interesses envolvidos no fórum de debates, como por exemplo, o interesse na queda do regime dos Aiatolás, que há 33 anos mudou completamente o cenário da região, recriando extremismos perigosos, alimentando ódio contra o ocidente. Por outro lado, interesses das forças contrárias, que desejam a diminuição, ou até extinção, da influência estadunidense.

Na verdade, o Irã, através de seu presidente Mahmoud Ahmadinejad, já ameaçou a existência do Estado de Israel diversas vezes, negando, inclusive, o holocausto por mais de uma vez, o que insultou a comunidade internacional mais ainda, tencionando a situação do Oriente Médio.

Por mais que estudemos o assunto, ainda não percebemos até onde o presidente Iraniano, com endosso dos Aiatolás, pode chegar. É muito temerária a situação, pois envolve atores internacionais com grande poder, força e interesse: Israel, EUA, Inglaterra, França, Rússia e China.

Há de se observar que existe uma divisão no grupo dos permanentes do Conselho de Segurança da ONU. Enquanto EUA, França e Inglaterra são a favor do endurecimento das medidas contra o Irã, a Rússia e a China, temendo um total controle do ocidente sobre a região que detém as maiores reservas de petróleo do mundo, não concordam em estremecer, mais ainda, as relações com o Radical país persa, que continua sua política de insultos públicos ao ocidente.

Acreditamos, inclusive, que diplomatas do ocidente tentam costurar um acordo com a Rússia e a China, sobre a influência na região. Se a tentativa for exitosa, então, o Irã ficará isolado e terá que ceder, ou cometer um suicídio político. A união dos permanentes pode ser o fim do imbróglio. .

Israel, apesar de ser considerado um país belicoso, com certeza a força militar mais organizada do mundo, tem sérias razões para temer o avanço do Irã, pois este, por diversas vezes já ameaçou exterminar seu Estado. O grupo de moderados, que tenta uma saída conciliada, acredita na boa fé dos iranianos. Mas, quando tratamos de política internacional, onde estão em jogo interesses hegemônicos, não custa lembrar quando Neville Chamberlain, primeiro ministro inglês, negociou, em 1938, com a Alemanha de Hitler e proclamou que o acordo de Munique trouxera a paz naquele tempo. E então Hitler invadiu a Polônia e eclodiu a segunda grande guerra mundial, se não a maior, uma das maiores chagas na humanidade, um grande flagelo.

Por isso que os atores internacionais do ocidente temem as articulações do Irã, ainda mais quando estão sob o manto protetor da China e da Rússia, duas grandes potências que têm interesses, também, no declínio da influência estadunidense e israelense na região.

Cautela é o nome da estratégia! Quando as luzes se acedem os atores interpretam seus papéis de magos da ilusão, mas na coxia, os maestros condutores da história, tramam o destino da região e do mundo